quinta-feira, 16 de maio de 2013

O mundo acaba em pizza. Ou em desespero.

(Acabei de encontrar este texto em uma das minhas pastas perdidas. Lembro te ter escrito para uma coletânea sobre o fim do mundo, em 2012.)

   


 “(...) para mim, pessoas mesmo são os loucos, os que estão loucos para viver, loucos para falar, loucos para serem salvos, que querem tudo ao mesmo tempo agora, aqueles que nunca bocejam e jamais falam chavões, mas queimam, queimam, queimam como fabulosos fogos de artifício explodindo como constelações (...)” – Jack Kerouac 


A frase do Kerouac é só pra dizer que, para Paula, a intensidade do fim do mundo seria inversamente proporcional à da vida de cada um. Aqueles que queimaram feito a tocha olímpica terminarão seus dias molhando o jardim, lendo um bom livro ou cozinhando pacificamente a última refeição de seus entes queridos, calmamente. Já os que passaram a vida na janela, empurrando com a barriga, comentando a vida dos outros e postergando sua própria entrarão em completo desespero. Para estes, o fim do mundo será um caos lamacento de urros, uma borrifada de ácido em carne viva. Estes sairão correndo sôfregos, intensificando a balbúrdia, procurando sentir naquele último vil minuto, tudo: sangue correndo nas veias, olhos brilhantes, entusiasmo contagiante, garra, vontade de viver. Vontade de viver? Agora?

O mundo vai acabar, só não se sabe quando. Para Paula era mais uma questão de despertar da consciência do que o fim propriamente dito. Transformações acontecem o tempo todo e quiçá nós, seres humanos, não sobrevivamos, mas o planeta certamente sim, como foi o caso nos últimos bilhões de anos. De qualquer forma, Paula resolveu viver como se fosse realmente acontecer. Não porque ela acreditava nesta profecia nonsense, mas porque queria parar de procrastinar os seus sonhos. Ficou extremamente surpresa com os resultados: é incrível o quanto torna-se possível quando nossa mente está pré-programada para o sucesso; não de maneira ambiciosa, mas de forma de manifestar a grandeza do que já está dentro de nós. Isso se dá através da auto-observação sincera e da perseverança. Se você quer as coisas, torne-as possíveis e insista. Em algumas ocasiões não está sob nosso controle? É verdade, mas você deve fazer sua parte. Pode ser que tenhamos apenas este momento. Tudo o que precisamos é coragem e determinação. Se o seu mundo estivesse chegando ao fim, como viveria o momento presente?

Bem, Paula fez jus ao termo “carpe diem”. Conversou com princesas e mendigos, socialites e artistas, limpou chão de restaurantes e sentou-se ao lado de celebridades. Foi louca. Foi santa. Viveu intensamente a solidão e a glória, andou de ônibus entre assassinos e de limusine entre milionários babacas. Viveu a dor, a saudade, a perda, a confusão. Mentiu, roubou, errou, acertou. Passou a respeitar o medo, mas só após ignorá-lo por muito tempo. Meditou em cavernas milenares na Índia, teve mestres, leu, abandonou muitos empregos e mandou os horários à merda. Fez tudo ao mesmo tempo. Tudo porque o mundo ia acabar. Só ainda não sabia quando. Ficou claro o quanto o medo era o maior destruidor de sonhos. Foi só arrumar um medo maior, um fim, que os outros viraram pó.

Paula teve seus méritos, mas queria mesmo era abrir os olhos para algo maior do que ela: o fato de que cada um de nós é um ser único, com uma combinação muito peculiar de experiências que só pode produzir um resultado inusitado. Se o mundo não tem este resultado melhor de si, então você não está fazendo seu trabalho... E todos nós estamos perdendo com isso. Paula queria dar o seu melhor. E queria obter o SEU melhor: sim, o seu, leitor! Queria que lhe desse algo que só você poderia trazer para este mundo, faceta única, de preferência antes do fim. 

Voltando à frase de “Na estrada”, de Kerouac, Paula chocou-se ao perceber o quanto nossa sociedade careteou ao longo dos anos. O fim do mundo é dos caretões, que deprimente. Pensou nos ETs falando “Vamos chacoalhar esse povo daqui, que eles não têm mais jeito. Viraram certinhos demais, uma sociedade chata, INSUPORTÁVEL em sua linha reta e em seu gosto pecaminoso em comentar as “escapadelas” dos outros, a “loucura” dos artistas, a felicidade dos que fazem aquilo que ninguém tem coragem. O politicamente correto tolheu esmagadoramente a liberdade de expressão, a liberdade de SER. É o fim de mundo em si mesmo, com ou sem catástrofes. Deixá-los viver seria deixá-los padecer no sofrimento”.

Também pensou que podíamos buscar formas mais atuais para mostrar ao mundo que a liberdade é a chave para a felicidade. Essa liberdade de anos atrás, que estava basicamente associada ao sexo livre e às drogas, está completamente ultrapassada. De que adianta uma liberdade que transforma o cara num fodido, ferrado no meio da crakolândia, um mendigo que “queimou, queimou, queimou como um fabuloso fogo de artifício”? E agora? Este cara queimou tanto para quê? O que ele tem para oferecer? Para contribuir? Para acrescentar? O cara vai morrer sozinho no meio fio de uma estrada. A vida dele foi linda. E em vão. A liberdade consciente era o que Paula queria, é o que precisamos buscar. A liberdade com propósito. Fresca, pura, aerada, moderna, sem preconceitos, falsos pudores, padrões estabelecidos e de livre expressão. A que respeita a liberdade do próximo, promove o bem estar, tanto o nosso como o do mundo a nossa volta. Esta liberdade não produz mendigos que viveram a vida intensamente... e sim os transforma em LÍDERES que não tem nada a perder. O pior já passou. Se conquistada, foda-se o fim do mundo. Nem importa!

Este tipo de liberdade também é a que me dá o direito de dizer que Paula é apenas uma personagem inventada para que eu não precisasse usar meu nome verdadeiro e dar um testemunho que criasse provas contra mim, nesta realidade careta. Mas isso não será mais preciso, é o fim do mundo. Eu vou comer a minha pizza e você, se estava aí para me julgar, vai arder no fogo do não-ser.

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